segunda-feira, 21 de março de 2011

Neste Dia da Poesia, uma modesta contribuição comemorativa

PIRILAMPEJO

Tenho um pirilampo no jardim,
minúsculo farol em plena relva
onde se arrasta, noites sem fim,
como se estivesse numa selva.

Apressado sobe à minha mão,
centímetro e vinte de contente,
pirilampa, espalha luz no chão,
mas no alto é muito mais luzente.

Alumia-me a alma por fases,
sem electrões ou pilhas alcalinas,
enche o meu pensamento com frases
do meu pai, na solidão das campinas.

Sentava-me ao colo e a lenda
servia de engodo ao deitar,
vaga-lume num copo, era prenda
certa, com moeda ao levantar.

Chegada a noite, era seguir
o pequeno pisca-pisca banqueiro.
Já apanhado, bastava pedir,
Para de noite me fazer dinheiro.

Agora crescido, devo-lhe muito,
tenho-o a ele,  não o meu pai,
tudo mudou, é outro o intuito,
da sua cauda, moeda não cai.

Quando à noite a cauda cintila,
busca o pirilampo seu amor,
que piscando para ele desfila
perdida numa noite de calor.

Mais tarde, fundidos na luz eterna,
com curto-circuito na barriguinha,
apaga-se o sonho, a lanterna,
mas sobe no céu uma estrelinha.

Devo aos vaga-lumes gratidão
pelo que me deram, quando menino.
Como companheiros de solidão
Iluminaram sempre meu destino.

6.5.2003

(In "Em Pedaços, vos digo")

O esclarecimento que Vos devo: Naquela época, a criança irrequieta apenas tinha, à noite, as estrelas. E que lindas elas eram, quando o céu estava limpo, pois de ozono nem se falava. Cedo tinha de ir para a cama, porque a iluminaçao, por candeeiro a petróleo (de que guardo um exemplar) estava sempre dependente da poupança do combustível. Para me convencer a deitar-me, meu pai apanhava um pirilampo e convencia-me de que, se me deitasse, tão simples e pequeno insecto se dedicaria a fazer-me uma moeda. Na verdade, pela manhã, lá estava uma moeda de um ou dois tostões dentro do copo de vidro. Talvez venha daí a ingenuidade de, muitas vezes, acreditar nas mentiras que me dizem, tão diferentes desta de meu pai.

Saudações amigas,

Fernando Castelo

2 comentários:

João Figueiredo disse...

Sr Castelo,

Muito me sensibilizou este seu poema. Na realidade, fez-me recuar no tempo confundindo-me com sentimentos diversos.

Hoje é tudo bem diferente.

Talvez não seja aqui o sitio indicado mas , mesmo assim , quero felicitá-lo por esta sua iniciativa , desejando felicidades a este seu projecto.

Com consideração ,

João Figueiredo

Margarida Mota Paulos disse...

Querido amigo
Parabéns por este poema,tão singelo,pueril até, tão pleno de sensibilidade,sinceridade,tão a lembrar outros tempos das nossas descuidadas infâncias.Bela maneira de celebrar o Dia da Poesia!
Margarida Mota