quarta-feira, 9 de janeiro de 2019

SINTRA E AS SURPRESAS DA VIDA

"Se fosse um caso urgente, de vida ou morte, bem podia o Senhor Presidente telefonar para o meu Centro de Saúde, que ninguém o atendia". 

A vida nem sempre é fácil e, ao longo dela, há sempre histórias e factos que nos doem, que nos atormentam, que nos marcam e, tantas vezes, nos desiludem.

É óbvio que o Sr. Presidente, mais Alto Magistrado da Nação,  tem um telefone que pode usar sem parcimónia, certamente acessível a ligações sem valor acrescentado.

Também se poderá pensar - injustamente - que o Valor Acrescentado não é visível por agora, pelo que certos usos serão subliminarmente projectados para o futuro.

Que pena não fazer uma ronda telefónica por vários Centros de Saúde para felicitar médicos, enfermeiros e outros profissionais, pelos sacrifícios que fazem.

No nosso Centro de Saúde, ninguém atenderia o telefone ao Senhor Presidente...a menos que, para surpresa, tudo fosse montado e preparado para o atendimento...

Longe de nós pensarmos que houve qualquer truque naquela chamada que levaria a voz do Senhor Presidente a milhões de portugueses...mas o que se seguirá?

Vivemos numa sociedade de truques

Há muitos anos, numa grande empresa, era prática dispensar-se os trabalhadores no dia do seu aniversário, uma atitude simpática das hierarquias próximas.

Um dia, um novo administrador - que tinha veias monárquicas - teve conhecimento do facto e decidiu que ele daria as devidas felicitações aos colaboradores.

Tal senhor presidente, afectuoso, passou a, bem cedo, ligar (também) para o aniversariante com a intenção de o felicitar pela data comemorativa da sua vida. 

Nos primeiros casos...não encontrou os destinatários...mas passou a saber-se que o Sr. Dr. XX tinha telefonado e o felizardo não estava por ter sido dispensado. 

A partir daí, o Sr. Dr. XX passou a encontrar sempre os aniversariantes que deixaram de gozar aquele dia segundo o que era hábito antigo e de agrado geral. 

Uns tempos depois, desabituados os colaboradores da dispensa do dia de aniversários, o Sr. Dr. XX deixou de fazer os elegantes telefonemas de felicitações.

Há sempre um truque surpresa

O Virgulino (chamemos assim) era um competente profissional mas, tendo exageradas ambições, tudo planificava para que resultassem boas recompensas. 

Convénio ou Reunião selectiva, concentração de influentes quadros onde pudesse mostrar-se, mereciam sempre um estudo para não se diluir entre os presentes.

Nesses dias, o que fazia o Virgulino para não se diluir no meio dos seus colegas sem resultados visíveis ou destaques que o pudessem favorecer?

Havia uma solução de recurso, qualitativa forma de dar nas vistas, numa época em que não havia telemóveis para SMS, WhatsApp ou outras formas instantâneas.

Naquela época as notícias não chegavam por telex, mas sim por telegrama,  

Uma grande equipa de jovens, sobre bicicletas, percorriam Lisboa de lés-a-lés, entre a Rua do Comércio e os destinos, levando os telegramas chegados à Rádio Marconi. 

No dia aprazado, à hora certa, o Orientador dos trabalhos dizia: 

"Chegou à Mesa um telegrama com o seguinte teor: 

"Impossibilitado por motivos de saúde de estar presente, envio uma saudação a todos os presentes e que se retirem as melhor conclusões para o nosso futuro". Assinado: Virgulino""

Seguia-se uma salva de palmas e o Virgulino tinha a sua presença na cabeça e coração dos presentes mais influentes e decisórios.

Quando das avaliações...dos desempenhos...grande parte dos trabalhadores eram anónimos...mas o Virgulino...esse era conhecido, apreciado e premiado. 

Teve uma ascensão rápida o Virgulino e, se hoje recordo, é porque passados tantos anos voltei a encontrar, por Sintra, artes de Virgulino, com pena e sem pena.



Devemos dizer que a Senhora não pode ser criticada por dela, eventualmente, alguém  se querer aproveitar para propagandas de teor populista gratuita. 

Aparentemente, a Senhora até achou estranho que lhe colocassem um telefone no local de trabalho, interrompendo-a, manifestando-se admirada pelo toque. 

Dessa forma, à hora certa, um estranho telefonema entranhou-se na vida política, com aquele desabafo "interrompi aqui uma reunião que tinha...(...)". 

Tão comovente...

Quando em 2016 pedimos a intervenção do Mais Alto Magistrado sobre os elevados preços da PSML que inibiam as crianças de aceder à Cultura e à sua História...


...a resposta foi "que a Presidência da República não dispõe de meios que lhe permitam dar seguimento favorável à sua solicitação"! 

Coisa que talvez se resolvesse com o mesmo telefone sem Valor Acrescentado.

Só que as crianças não votam...e populismos têm horas certas para destinatários.

As surpresas cada vez são mais banais.









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