quarta-feira, 12 de abril de 2017

ABRIL, QUANDO OS CARDOS TAMBÉM SÃO FLORES

A minha infância teve o condão de me mostrar como sobrevive uma criança com nada.

Por azar ou sorte, nasci nu, orgulhando-me por ter sido lavado a primeira vez numa banheira de folha e depois vestido com roupas feitas em casa.

Primeiros passos descalço, repetindo-o muitas vezes já mais crescido pois sapatos deviam ser poupados. Que prazer pisar terrenos meio secos depois da chuva..

E fizeram-se moinhos de água com canas, movimentando-se nos regatos. E subiram-se árvores, e dormiu-se no meio de searas de trigo ou debaixo de fardos de palha. 

Por isso, não se pode enjeitar nem um milímetro dos passos e raízes da infância.   

As alegrias de hoje

Digo que o meu mundo está cheio de coisas lindas, porque sei fazer com que elas me encantem. O nosso coração tem de saber bombear nos bons e maus momentos. 

Não podemos desfolhar malmequeres...quando todos eles são bemmequeres.

Quem terá a coragem de chamar malmequer a esta maravilha selvagem?...

Ou a esta maravilha do meu jardim?

Na vida, os cardos também são flores e que belos nos campos floridos.


A beleza destes cardos enche de alegria o coração mais triste

Só dirá que são azedas quem não tenha sentido na vida o doce sabor da sua seiva.


Esta doçura alguma vez pode ser azeda?

Tenho a sorte de quase todos os dias, depois de almoçar, caminhar junto a campos em flor, entrar por eles dentro, sentir o seu cheiro que me faz recordar a infância.


Faço-o sozinho, entregue ao reviver daquela juventude que se divertia com um arco e uma gancheta, que fazia um telefone com latas de graxa, que jogava ao berlinde. 

Apetece desafiar, puxar por um puto de hoje para jogarmos com caricas pelas bordas do passeio, ensiná-lo a fazer uma bola de trapo, apanhar pássaros com visco.

A vida, hoje, tornou-se mais rica, porque tudo nos enche o coração de alegria.

Hoje, ouvindo o zumbido de uma abelha, repesquei o escrito há muitos anos: 

UMA TENTAÇÃO


Nas serras da minh' infância,
Com mato e alecrim,
os cardos de tão azuis,
ficaram dentro de mim.

Nas serras da minh' infância,
as giestas eram belas,
Floridas, tão amarelas,
no meio do rijo capim.

Nas serras da minh' infância,
havi' abelhas zumbindo,
de flor em flor extraindo,
néctar de vida sem fim.

Um mel assim fabuloso,
aromado de cidreira,
vai ficar p'rá vid'inteira,
como ditoso festim.


Nota: Fotos de hoje. 

Sem comentários: