domingo, 6 de outubro de 2013

LISBOA: CONHECÊ-LA, DE CALÇÕES, ENTRE 1953 E 1956...

Naquela época, não havia psicólogos para apoiar as crianças que, filhos da Grande Guerra, começavam a trabalhar para ajudar a família a sobreviver.

Lembro-o para que na história se inscrevam os trabalhadores de calções, que depois de uma vida árdua e trabalho hoje estão sendo espoliados das sua pensões.

Primeira desilusão aos 14 anos. Sem posses, deixei o Liceu para trabalhar (estudaria à noite). Um anúncio, pedindo "Rapaz para paquete", criou-me o "sonho de viajar pelo mar", rapidamente desfeito ao saber que a função era mais para recados...

Nessa tenra idade, em que pouco conhecia de Lisboa a não ser do caminho para o Liceu de Camões ou uma espreitadela às miúdas do Filipa (a polícia vedava aproximações...) comecei a percorrer Lisboa de lés-a-lés, quase sempre a pé.

Se calhava ir para Alfama, não podia perder o Chafariz de Dentro, ou a Rua de S. João da Praça, a Rua do Terreiro do Trigo e as docas, com fragatas, mesmo em frente.

Tinha um prazer imenso em passar pelo Beco do Carneiro e olhar os dois prédios que, na altura, se encostavam e imaginava os vizinhos a passarem coisas de uma janela para outra, bastando esticar os braços. Agora estão mais afastados.

Beco do Carneiro como está hoje. As obras afastaram os telhados

Às vezes, tinha a companhia do Florindo, linotipista no Bairro Alto, que apanhava o comboio em Santa Apolónia. Entrava numa tasca na Rua do Terreiro do Trigo e pedia: "Dois pastéis de bacalhau e um de dois branco...também vais no branco"?
 
Ao refazer estes caminhos, sinto como que uma solitária homenagem àquele amigo, na casa dos 50 anos, apaixonado pela cidade de Lisboa, sempre com um livro na mão para ler "nos tempos livres" ou no comboio a caminho dos Olivais, onde morava.
  
Quem imaginará imagens destas dentro da cidade de Lisboa?
 
Há dias, nesta zona e junto ao Beco da Lapa, descobri esta frondosa bananeira que, um residente, me garantiu dar boas bananas. Uma estranha imagem de Lisboa. 
 
Regressava pela Rua da Alfândega ou por Santa Clara, até à estação do Rossio, de onde partiam os comboios para Sintra e Azambuja, mais os Expressos Lusitânia e julgo que o Sud Expresso, estes últimos puxados por máquinas potentíssimas.  
 
Outras histórias ficarão para um dia...talvez próximo.
 
 
 

2 comentários:

António disse...

Com a ingenuidade da idade cedo se planeavam objectivos futuros, e o sonho era sempre a capital.Pretendia-se a procura de uma profissão que garantisse uma vida melhor. Pelas mesmas circunstancias e por essa altura, eu era aviador, é verdade aviador, aviava gasolina no moderno posto de abastecimento ATLANTIC, em Sintra, hoje BP.

Fernando Castelo disse...

Caro António, a vida era mesmo isso, lembro-me que até dizíamos "aviador de balcão". Hoje, que pensarão os nossos governantes sobre a vida? Até os nossos filhos e netos. Que julgarão eles sobre as nossas vidas, os pés descalços, os calções cum fundilhos? Um abraço