quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

PAI NATAL...VÍTIMA DA CRISE

Não foi agora. Foi há uns anos que observei atentamente o dia de um Pai Natal.

Para quem é utente dos comboios e passa pela estação do Rossio, direi que a seguir àqueles dois lanços de escada da Calçada do Carmo havia uma porta velha e suja, penso que entrada para uma residencial. Foi nessa escada que encontrei o Pai Natal.

O choque foi imenso apesar dos meus talvez cinquenta anos. Talvez porque nos anos da guerra o Pai Natal era o único sonho de uma criança, talvez por momentos antes ter visto o mesmo Pai Natal a passear entre  a Rua Primeiro de Dezembro e a Praça D. Pedro IV rodeado de criança, envolvendo-as numa onda de alegria. Daí ter escrito...

COMO MUDASTE, PAI NATAL...

Pobre Pai Natal
Que estavas naquela escada escura,
suja e de passagem rápida.

Escada de pensão de zero estrelas,
com corpos sujos rápidos
na passagem.

Era a hora do almoço
para quantos ainda conseguem
comer, no meio da fome. E vi-te!

Não digas que é mentira!
Tinhas tirado as barbas
que nunca foram brancas,
nem no fabrico.

Teu corpo magro, sentado
Num primeiro degrau
E rosto sem sorriso.

Num pequeno tacho de alumínio
Trazias o magro almoço,
já tão frio.

ARREPIANTE!

Não digas que é mentira!
Comias em sorvos largos
para rapidamente voltares
à rua das tuas crianças.


Ali, encostado ao lancil,
nada tinhas dos sonhos
que criaste em nossa infância.

Como eu sonhei com Pai Natal
gordo. Cheio de fartura,
rodeado de amor e de riqueza.

Foste o final da minha ilusão,
Pano de um palco, rasgado
A quem foi tão inocente.

Deixei de te ver como nos sonhos,
Passei a ver-te, triste, como gente.


In "Em pedaços vos digo"