sexta-feira, 10 de abril de 2015

"MARCAS" QUE NINGUÉM COMPRA...

Quando hoje os jovens despicam sobre marcas de ténis ou Jeans, e o convívio familiar passou para marcas de smartphones, iPads ou Tablets, lembremos outras marcas...

Marcas da vida, numa aldeia longe de Lisboa, 1945.

Os efeitos da II Grande Guerra, embora Portugal oficialmente nela não tenha entrado, faziam-se sentir nas dificuldades com que a população vivia. 

Francisca residia numa casa térrea, dois altos degraus de pedra para nela se entrar. Sentidas as dores de parto, foi chamada uma mulher da aldeia que fazia de parteira. Disse: - "Está na hora, arranjem uma banheira com água morna. Umas toalhas."

Francisca tinha outro filho, na altura com 6 anos e alguém o mandou ir passear para o campo, ver passarinhos ou "correr" com um arco e gancheta porque fazia bem.

Quando depois da "corrida" chegou a casa, o outro filho tinha um irmão chorando!!!

Dois dias depois, num tanque cinzento e de frio cimento, Francisca já lavava e, do outro lado da rua, punha a corar ao Sol as fraldas do novo rebento.

O neófito nascera de 7 meses e tinha um problema grave nos olhos. Precisava de ser urgentemente assistido e só em Lisboa havia uma instituição vocacionada para esses casos: O Instituto Gama Pinto.

Numa quase madrugada, a que se sucederam outras tantas, Francisca com o novo filho nos braços e o mais velhinho ao lado, seguia a pé ao longo de vários quilómetros até apanhar a "carreira" que, com outras mudanças, a faria chegar ao Instituto.

Regressavam de noite. Filho ao colo alimentado pelo seu peito, dela que pouco tinha comido do farnel que levara e não repartira consigo, para dar tudo ao filho mais velho, que ela dizia "precisar mais, por estar a crescer".

Enquanto Francisca preparava o jantar, o filho mais velho brincava na rua. Jogava ao toca-e-foge ou com uma bola de trapo. Às vezes havia umas pereiras ou nespereiras que o chamavam para comer um dos seus frutos...a que se seguia uma rápida corrida.

Antes de se deitar, à luz de uma lamparina, Francisca ainda tinha forças para obrigar o filho mais velho, às vezes com um puxão de orelhas, a cumprir os "deveres escolares", num caderno de duas linhas azuis...escrito a tinta com um aparo.

E vinham manhãs sobre manhãs, dias sobre dias, os anos. Os calções, ajustados das calças do pai, a precisar de fundilhos. Loiça e roupa lavadas à mão. Corar a roupa ao Sol quente. Passar a ferro de carvão os bibes azuis com quadradinhos. 

Francisca fazia anos a 10 de Abril. 

Marcas de vida...que ninguém compra nem das quais há contrafacção.



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