sábado, 10 de novembro de 2012

REVISITAR LISBOA...PERCURSOS ANTIGOS (III) - A TRINDADE

ENTRE SINTRA E O ROSSIO...
 
Para Lisboa só utilizo combóio. Na carruagem, observo o que se passa, sem descurar o exterior, enquanto aumenta o apetite pelos pastéis de bacalhau da Casa Chineza. 
 
Na passada semana, uma jovem entrou na Portela, sentou-se à minha frente, logo pegou no smartphone e ligou: "Olá, já fui ao centro de emprego, disseram-me...blá...blá...blá...(...), agora tenho de desligar...estou a entrar no túnel. Um beijinho".
 
Fico invejoso por não ter um plano tarifário barato, igual ao que - pelo que deduzo - a minha desempregada companheira desfruta.

Desde que Passos Coelho me transformou de "reformado" em "pagador da crise", gasto menos de 5 (cinco) euros por mês em telemóvel. 

Para não escutar, fixei-me nas monumentais estações do Cacém e Barcarena, mais ajustadas aos Emiratos que vendem petróleo ao mundo. Não a um país com a corda ao pescoço. Era preciso aquilo para serem funcionais? Quem vai pagar?

DA RUA ÁUREA À TRINDADE, SUBINDO O CHIADO

Desço a Rua Áurea recordando os moços de fretes que paravam nas esquinas da Baixa. Homens possantes que - com cordas pendentes dos ombros - esperavam que alguém os chamasse para transportarem os mais diversos e pesados objectos.

Viro para a Rua da Assunção e, no canto da Rua do Crucifixo, o incêndio do Chiado ajudou ao desaparecimento da grande pedra gravada que localizava a Vacaria Áurea. Perto, temos o painel de azulejos do Sabonete Santa Iria, talvez difícil de retirar...

 
No cantinho, já não posso utilizar o belíssimo elevador que havia no Grandella. Opto por fazer a penosa subida do Chiado, sem o Leonel, o Martins e Costa, a Casa José Alexandre ou o Eduardo Martins. A Leitaria Garrett e a Pastelaria Marques sem vidas.
 
Passo a Brasileira, a estátua do poeta que ainda não foi roubada para ser fundida, e subo a Rua Nova da Trindade, de que tantas recordações guardo.
 
No velho Theatro do Gymnásio fui actor pela primeira e única vez em 1950, na festa dos alunos do Manuel Bernardes. Lá continua, imponente, carregado de história:
 
 
Um pouco mais acima, devidamente recuperado, o belo Teatro da Trindade:
 
 

Mas, no meio de tanta alegria, o final do percurso reservava-me a profunda tristeza de não poder voltar a sentar-me nas mesas do velho Restaurante da Trindade, de que guardo tantas recordações. Fechou as portas em Janeiro. "Foi a crise", disseram-me.
 
 
Fiquei desolado, fez parte da minha vida, lá me encontrava com colegas, amigos, contavamos das nossas vidas e partíamos para mais uma tarde de trabalho. 
 
Hoje, a crise serve para justificar tudo. Será mesmo assim? Não estaremos a exagerar na invocação da crise para justificar a destruição colectiva do nosso passado?
 
Acho que sim. Não podemos aceitar esta sociedade de fechar portas.
 
Porque depois das portas fechadas, também se fecharão os corações.
 
Desta vez, nem o Restaurante da Trindade escapou...
 

   
 

 

 
 
 

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